17 de junho 2015
Brasil
TCU julga contas do governo Dilma e decidirá sobre 'pedaladas fiscais'
Ministros podem sugerir ao
Congresso reprovar ou aprovar o balanço.
'Pedaladas' teriam sido feitas para atingir metas fiscais; ENTENDA.
O Tribunal de Contas da União (TCU) julgará, nesta quarta-feira
(17), as contas de 2014 do governo de Dilma Rousseff, último ano de seu
primeiro mandato e quando ela se reelegeu.
Os ministros vão avaliar, entre vários
outros itens, uma questão polêmica: as chamadas “pedaladas fiscais”, que já são
alvo de um processo na corte. Um dos ministros, relator do caso, disse que
atrasos em repasses do Tesouro Nacional a bancos descumprem a lei. O governo
nega ter feito manobras fiscais.
O julgamento das contas ocorre todo ano,
como determina a Constituição. Nele, os ministros do tribunal vão dizer se
recomendam ou não ao Congresso a aprovação das contas do governo do ano
passado.
Entenda a seguir como será o julgamento e
o que são as “pedaladas fiscais”:
1. O que os ministros vão analisar?
Eles vão avaliar se o governo está
cumprindo as regras na gestão dos recursos públicos, como a Lei de
Responsabilidade Fiscal. Será julgado o relatório sobre os orçamentos e a
atuação governamental, feito por diversos órgãos e consolidado pela
Controladoria-Geral da União (CGU), além do Balanço Geral da União, de responsabilidade
da Secretaria do Tesouro Nacional.
2. O que foram as “pedaladas fiscais”?
É um nome dado a práticas que o governo
teria usado para cumprir as suas metas fiscais. O Tesouro Nacional teria
atrasado repasses para instituições financeiras públicas e privadas que
financiariam despesas do governo, entre eles benefícios sociais e previdenciários,
como o Bolsa Família, o abono e seguro-desemprego, e os subsídios agrícolas.
Os beneficiários receberam tudo em dia,
porque os bancos assumiram, com recursos próprios, os pagamentos dos programas
sociais. Com isso, a dívida do governo com os bancos cresceu.
Segundo o processo aberto no TCU, cerca de
R$ 40 bilhões estiveram envolvidos nessas manobras entre 2012 e 2014.
3. Por que o governo precisou disso?
Citando reportagens da imprensa, o
Tribunal de Contas da União diz que as "pedaladas" serviram para
aumentar o superávit primário (a economia feita para pagar parte dos juros da
dívida pública) ou impedir um déficit primário maior – quando as despesas são
maiores que as receitas, sem contar os juros.
Em 2014, as contas públicas tiveram
resultado ruim devido ao aumento de gastos do governo em ano eleitoral, à ajuda
para o setor energético e à queda real da arrecadação – resultado do fraco
nível de atividade da economia e das desonerações de tributos anunciadas nos
últimos anos.
E mesmo com manobras, o governo não
conseguiu cumprir as metas fiscais do ano passado e teve de enviar lei ao
Congresso Nacional para alterar os objetivos antes propostos.
4. Qual é o entendimento do TCU?
As “pedaladas” ainda não foram julgadas, mas o TCU
avaliou, de forma preliminar, que os atrasos de recursos para os bancos
apresentam “nítidas características de operação de crédito” (de natureza
orçamentária ou extraorçamentária, conforme o caso) entre a União e
instituições financeiras oficiais. Ou seja, é como se o governo tivesse tomado
empréstimos de bancos como a Caixa Econômica
Federal e o Banco do Brasil,
o que é proibido pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
De acordo com o TCU, trata-se de uma operação de crédito
porque os bancos fizeram os pagamentos de benefícios aos destinatários, como os
segurados da Previdência, e o governo ainda não pagou tudo aos bancos ou fez
pagamentos com atraso.
O relator do processo no TCU, ministro José Múcio,
comparou, em abril, a prática adotada pela equipe econômica do governo ao uso
irregular de um cheque especial. Ele disse que “não há dúvida” de que houve
descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal, mas apontou que não há
indícios de corrupção.
5. O que diz o governo federal?
O governo federal, por meio da Advocacia-Geral da
União (AGU), do Ministério do Planejamento e do Banco Central,
admitiu que os atrasos nos repasses de recursos aconteceram nos últimos anos,
mas acrescentou que isso é uma “prática antiga”, registrada também no governo
Fernando Henrique Cardoso, e que as “pedaladas fiscais” não representam
operações de crédito propriamente ditas.
O governo argumenta que as operações (que seria
irregular se fosse um empréstimo feito de bancos públicos para a União) têm
origem em contrato de prestação de serviços, como se houvesse, por exemplo,
atraso no pagamento de um aluguel.
Em maio, no Congresso Nacional, o ministro do
Planejamento, Nelson Barbosa, admitiu que as chamadas "pedaladas fiscais”
atingiram "valores muito excessivos, o que não é prática usual e
recomendada". Mas acrescentou que esse procedimento não é ilegal, pois, em
sua visão, não constitui empréstimo de bancos públicos para a União.
6. Quem deve se explicar?
Sobre as “pedaladas fiscais”, o tribunal
cobrou explicação de 17 gestores do governo federal, entre eles o presidente do
Banco Central,Alexandre Tombini, o ex-ministro da
Fazenda,Guido Mantega, os ministros do
Planejamento, Nelson Barbosa, e do Trabalho, Manoel Dias, o
ex-secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, e o ex-presidente do Banco do
Brasil e presidente da Petrobras,Aldemir Bendine.
7. O que acontece se as contas não forem
aprovadas?
O TCU não tem poder para reprovar as
contas do governo. O que a corte faz é elaborar e votar um parecer que sugere
ou não aprovação, que pode ser com ressalvas. Esse parecer, então, é
encaminhado ao Congresso que, aí sim, tem a responsabilidade por fazer o
julgamento político da atuação do governo.
O trâmite prevê que o relatório do TCU
deve ser avaliado pela Comissão Mista de Orçamento e, depois, pelo plenário da Câmara e
do Senado. Se as contas do governo forem realmente rejeitadas nessas votações,
a presidente Dilma Rousseff pode ser alvo de um processo de impeachment.
Uma das razões é justamente o caso das
“pedaladas” que, para o TCU, fere a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Entretanto, nunca as contas de um
presidente brasileiro forem reprovadas. Em 1937, durante a ditadura de Getúlio
Vargas, o ministro do TCU Carlos Thompson Flores apresentou parecer pela
rejeição das contas do governo do ano anterior. Seu parecer, porém, não foi
aprovado pelo plenário da corte.
O que é o TCU e para que serve?
A Constituição de 1988 conferiu ao TCU o
papel de auxiliar o Congresso Nacional no exercício do controle externo. Entre
as competências constitucionais estão apreciar as contas anuais do presidente
da República; julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por
dinheiros, bens e valores públicos; apreciar a legalidade dos atos de admissão
de pessoal e de concessão de aposentadorias, reformas e pensões civis e
militares; realizar inspeções e auditorias por iniciativa própria ou por
solicitação do Congresso Nacional; fiscalizar a aplicação de recursos da União
repassados a estados, ao Distrito Federal e a municípios; determinar a correção
de ilegalidades e irregularidades em atos e contratos; emitir pronunciamento
conclusivo, por solicitação da Comissão Mista Permanente de Senadores e Deputados, sobre despesas
realizadas sem autorização; e apurar denúncias apresentadas por qualquer
cidadão, partido político, associação ou sindicato sobre irregularidades ou
ilegalidades na aplicação de recursos federais.